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A Poesia está na Rua (e no Cartaz)


Sob proposta de Sofia de Melo Breiner, que já para o 1.º de Maio de 74 escrevera o verso em composição dedicada aos militantes do P.S. (partido pelo qual integraria as listas à Assembleia Constituinte, vindo nela a ser deputada após essas primeiras eleições livres, a 25 de Abril de 1975), Maria Helena Vieira da Silva concebeu, pelo menos - quem isto assinala estava capaz de garantir já ter visto terceira versão -, dois cartazes ilustradores de «A Poesia está na Rua», saídos a público nesse primeiro aniversário e agora aproveitados para a exposição homónima que hoje, comemorando os exactos 40 anos da Revolução, vai a inaugurar na Galeria do Palácio de Cristal, no Porto. Dos dois, um, não menos genial, apresenta o típico traço que celebrou a pintora, a que certa escolástica artística chama abstracto. O outro, de belo efeito, que aqui se mostra, foi na sua figuração mais fácil e apropriado ao propósito que lhe deu azo, permanecendo por isso até aos nossos dias o propriamente icónico e em regra reproduzido. Dessa figuração terá um olhar atento, ou apenas insistente, muito a dizer.

Não sabendo se alguém o notou, nem se a pintora alguma vez o chegou a referir, parece indiscutível ser o primeiro rosto - fileira da frente, à esquerda - o de Pascoaes (que Maria Helena dizia apreciar): é, sem tirar nem pôr, o desenho de um dos seus, assumidamente toscos, auto-retratos. A custo se discutirá que à direita na segunda linha estejam os de Pessoa e Eça. E, em subida progressiva, quase se juraria ainda reparar nos de Régio, Cesariny, Aquilino e Ruben A. (primo da escritora), para não jurar que o (ainda mais) taciturno ao lado de Pascoaes seja o de Camilo, e que a mulher à porta do prédio fosse a própria Sophia, e a mais ao alto a própria Maria Helena - hipóteses, mesmo assim, nada de descurar. Escusado reforçar o ponto com alguns casos já de dúvida, entre gente nacional e estrangeira, sobretudo francesa (Proust e Char, por exemplo). O que temos como certo chega para perceber que o mote, A Poesia está na Rua, foi levado à letra e de maneira radical: não era só a poesia, era a palavra em sentido amplo. Dirão os neo-cépticos / neo-austeros / neo-liberais (paremos por aqui, para o novo parar de estragar o velho...) que a simples ideia disso não passa de literatura.