Se o suicídio de Camilo, de que há pouco se tratava, foi o grande trauma activo, o homicídio de Inês de Castro foi o passivo, com consequências literárias propriamente ditas, e como nenhumas outras nas nossas letras. Nenhum outro motivo terá dado ensejo a tanta folha de papel impresso por bandas lusas. Garcia de Resende, Camões, António Ferreira e Francisco Manuel de Melo, já se sabe, entre muita mais gente quinhentista e seiscentista. Bocage, depois. Os principais românticos, estranhamente, passaram-lhe bastante ao lado, o que é tanto mais estranho quanto Garrett (chegou a esboçar um drama, depois de assegurar que "Inês de Castro, o mais belo e poético episódio do riquíssimo romance da história portuguesa, está por tratar ainda") e Camilo teriam feito do tema o que entendessem; também a Geração de 70, já sem estranheza nenhuma. Mas, de aí em diante, a coisa é quase omnipresente, sobretudo falando de indivíduos com alguma ligação, natural, afectiva ou académica, a Coimbra: Eugénio de Castro, António Patrício, Antero de Figueiredo, Lopes Vieira, Rocha Martins, etc. Até nos contemporâneos: Natália, Fiama e Agustina, pelas senhoras, e pelos senhores nem vale a pena começar uma lista que teria início alfabético e apropriado em Alegre, Manuel. Saliente-se só o original tratamento dado por Herberto (que poderia porém ter feito ainda muito melhor) no texto incluso n'Os Passos em Volta.
Desde já se pede desculpa aos nomes úteis, quase todos, pela mistura com inúteis porém famosos, flagrantemente dois.
Desde já se pede desculpa aos nomes úteis, quase todos, pela mistura com inúteis porém famosos, flagrantemente dois.
Pouco menos (em certa época, mais) que as lusas, as castelhanas, depois espanholas: aqui ao lado así mismo se fartou de perorar, sobretudo em teatro, como por cá, acerca do drama desta galega criada em Castela com a castelhana Constança. O próprio Quevedo pegou no assunto, e ainda hoje se lhe pega.
Pasmai: até na China e no Japão continua a levar-se à boca de cena versões à moda do extremo oriente.
Pasmai: até na China e no Japão continua a levar-se à boca de cena versões à moda do extremo oriente.
E tal as letras, as artes. De modo mais obsessivo, como costumam. Talvez falhe a memória, que se recorda de dois casos evidentes: o recente defunto Espiga Pinto, com milhentas variações à volta de Inês-loura-cósmica, e Lima de Freitas, com outras numerosas do Rei-Saudade e da Rainha-Morta, um fantasma vivo enlouquecendo do esqueleto do não-fantasma morto.
Tudo isto pode parecer um tanto doentio, mas entende-se lindamente. Quem entre desprevenido nesta história nunca mais dela sai.