Ainda sobre Descobrimentos. Tem dado notícia na imprensa e na web (que vê polémica e risota seguirem crescentes) a venda a uma galeria nova-iorquina especializada em iluminuras, por um livreiro antiquário português, de um manuscrito luso no qual figura, dentro de uma letra capital «D», o desenho do que se logo aventou um canguru. Julgar-se a peça composta entre o final do séc.XVI e o início do XVII acentua a hipótese - que vários historiadores têm sugerido - de a Austrália não ter sido descoberta, por navegador holandês, em 1606 e sim antes, à imagem do caso americano (Colombo, o oficial, chegou cinco séculos depois dos vikings, cuja aportação à Terra Nova é sabida). Certo que, até prova concludente, não valerá embandeirar o useiro entusiasmo auto-glorificador lusíada em arco: ainda que o manuscrito anterior a 1606 e o animal representado, efectivamente, um canguru, continua a faltar o corpo de evidência: a garantia de o desenho ter sido feito à vista desarmada, in situ ou memorando, e não em cópia. Se, como se diz, a autora do manuscrito fosse uma freira de um convento das Caldas, não parece muito pertinente, passe o mau feitio, imaginá-la em tão meridional e peregrina missão aos aborígenes, navegando no meio da súcia marinheira. É bem possível que (também aqui como na América, before Columbus) hajam pela Oceânia passado portugueses antes dos demarcados holandeses. Mas a fácil rapidez com que se pretende fazer uma pequena curiosidade assumir foros de revolucionária prova histórica, mais a mais, quase implausível, torna-se espantosa coisa. Sem emenda.